segunda-feira, julho 23, 2007

MANUEL CRUZ PRADA:
Linguagens da natureza matérica, das tecnologias industriais e do artefacto humano

O contributo inovador mais decisivo para a revolução formal e conceptual da “escultura em português”, não pode deixar de atribuir-se à influência marcante de alguns autores, no último quartel do séc. XX, de entre os quais se destacam, a título exemplar, M. Ferreira da Silva, Fernando Conduto, Hélder Baptista, Charters d’Almeida, Dorita Castel-Branco, Figueiredo Sobral, Zulmiro de Carvalho, Virgílio Domingues, Jorge Vieira, João Cutileiro, José Rodrigues e Francisco Simões…

De uma mais recente plêiade de criadores, surgida nas décadas de oitenta e noventa, novos valores viriam a salientar-se, quer assumindo novas atitudes conceptuais e diferentes posturas, em relação a algum revivalismo emergente, ainda, das morfologias alegóricas tradicionais, quer postulando acepções estéticas portadoras de significância sociocultural diversa, ou explorando atributos recônditos da linguagem dos materiais primários, tratasse-se de pedras-rocha e madeiras, de metais ou produtos industriais, reabilitados para a expressividade plástica, táctil e volumétrica, apoiada em avanços tecnológicos da actualidade contemporânea.

Manuel Cruz Prada – que, em 1988, ensaia a cerâmica e faz a sua primeira aparição no IPJ, em Braga – tende a aproximar-se, a pulso, da notabilidade alcançada por escultores investigacionais de dimensão monumental, mensageiros de “novas formas da fala humana”, como Manuel Patinha, Paulo Neves, Abílio Febra, J.A. Nobre, Xico Lucena, e, entre outros, de gerações igualmente próximas, como Carlos Botelho, Isaque, Rogério Timóteo, António Canau (Espadinha) já firmados, porventura, em percurso e obra, mais sólida e matura.

Discípulo de José Rodrigues , ele beneficia de um raro privilégio, a “porta, sempre aberta, do atelier” do Mestre, tendo sabido conquistar a sua atenção e um afecto lateral ao domínio do pensamento crítico: […] “As tuas aventuras, foram-se transformando em “coisas” orgânicas, sensuais e eróticas. Fizeste bem em ter visitado o atelier do mestre Brancusi – agora é contigo! – a estrada é imensa …O céu está coroado de estrelas, escolhe uma e segue-a” .

Deve salientar-se a dignidade da sua presença no Museu da Pedra de Cantanhede, onde exibe peças de desenvolvimento temático, de admirável carga simbológica e técnica experimental apuradíssima, em que o desenho estrutural e a dinâmica espacial interagem, exprimindo-se, com hierática eloquência, nas linguagens da natureza matérica, das tecnologias industriais e do artefacto humano: o Aço Inox, o bronze e o mármore.

Posto que a valia do seu trabalho merecesse, ainda e, mesmo aqui, um mais amplo e detalhado estudo analítico, saliento esta inspirada recensão, a respeito da sua obra: […] “la contundencia de quien logra expresarse tras una búsqueda seria y profunda, con un dominio técnico que no es sino el imprescindible soporte material de una magnifica concepción” .

Coopto este esperançoso e lapidar augúrio, recente, ainda, decalcado de José Rodrigues, seu mestre e amigo, também, como fecho desta breve apresentação de Manuel Cruz Prada, com certo sabor premonitório: “o tempo se encarregará de falar/escrever sobre as tuas coisas”!






José-Luis Ferreira
Caramulo
2007-07-05

[1] nasc. Luanda, 1936, Escultor pela (ESBAP), onde foi professor, até 1998. É um dos fundadores da Cooperativa Árvore, ligado à organização das bienais de Vila Nova de Cerveira e referência nacional na arte da escultura.
[2] Brancusi, Constantin (1876-1957) The Essence of Things Tate Modern – London, 2004, citado por José Rodrigues, em carta de 2005.
[3] extracto de um texto original de Elena Kravetz, Córdoba, Argentina, 2005.